O leitor já observou certamente as condições em que muitos de nós são obrigados a trabalhar? Não é verdade que nos sentimos frequentemente num estado de "stress"? Ora quase todos nós temos de trabalhar para podermos sobreviver. Não propriamente para "viver". Mas, para "sobreviver". E sublinho este ponto: "Para viver é preciso primeiramente sobreviver. Porém, em caso algum, a vida deve ser substituída pela sobrevivência". Por essa razão, o Mestre Agostinho da Silva dizia com frequência que "o homem não fora feito para trabalhar, mas para criar". Contudo, sobre este assunto teremos de falar demoradamente, porque o bom senso adverte-nos de que não devemos confundir as pessoas, incitando-as a uma ociosidade negativa e a uma não participação na vida social. Mas, uma reflexão é necessária: Se o trabalho é considerado por muitos como salutar, é também, e não raramente, causador de desequilíbrio físico e psíquico. Ora, como tudo aquilo que causa desequilíbrio não é benéfico para o indivíduo nem para a sociedade, é importante refletir sobre o verdadeiro significado do trabalho.
Comecemos pelo significado da palavra "trabalho": Esta palavra deriva do termo latino "tripaliu", que era um instrumento de tortura. Compreende-se assim por que razão a palavra "trabalho" conserva ainda uma certa conotação negativa, associada quase sempre à ideia de esforço, de sacrifício, de sofrimento... "Ganhar o pão com o suor do nosso rosto" é uma expressão que se consagrou e que traduz de certo modo a ideia a que fizemos referência. Outras vezes, o trabalho anda também associado à necessidade de fugirmos de nós próprios e dos nossos problemas. Trata-se, neste caso, de uma forma de evasão, de escape, de alienação... Neste sentido, nem sempre se poderá dizer, evidentemente, que haja dignidade no trabalho. É isso que esta história nos pretende mostrar: "Quando caminhava só, numa praia deserta, um homem encontrou uma garrafa que tinha sido transportada pelas ondas. À primeira vista, era uma garrafa vulgar. Mas, quando tirou a rolha, imediatamente se libertou um fumo azulado que, a pouco e pouco, se foi adensando e configurando num rosto enorme e terrível. Era o Génio da garrafa. E logo, com um vozeirão ululante e ameaçador, gritou: "Sou teu escravo. Faço tudo que quiseres; mas, com a condição de me dares trabalho, sempre mais trabalho; senão mato-te!" Porém, esta ameaça não intimidou o homem. Como era comerciante e tinha muito que fazer, ficou contentíssimo. Despediu imediatamente os seus empregados e encarregou o Génio de todos os serviços. Contudo, não contava com a sua rapidez de execução. O Génio realizava quase instantaneamente o trabalho que lhe era pedido e, sempre insatisfeito, gritava: "Mais trabalho, meu Senhor, senão mato-te!" As coisas começaram então a complicar-se. E, se a princípio não faltava trabalho, agora o homem já não sabia o que devia mandar o Génio executar. E, cada vez mais receoso de que este cumprisse a sua promessa e o matasse, foi, por esse motivo, pedir o conselho de um sábio, que lhe disse: "Não te preocupes. Quando o Génio te exigir mais trabalho, manda-o endireitar o rabo de um porco." Essa foi, de facto, a salvação! É que, ainda hoje, o Génio anda ocupado a tentar endireitar o "rabo do porco"! E ainda não conseguiu, nem conseguirá tão cedo. O leitor talvez vê nesta história alguma coisa que se possa relacionar consigo? Pense bem: O Génio é, muitas vezes, você próprio, em busca de algo para fazer, algo que sirva para "matar o tempo", mesmo que esse"algo que fazer" não represente mais do que um consumo inútil de energia. Já pensou nisso? Já viu quantas vezes chega a casa esgotado e triste. e que fez realmente de positivo? Talvez estivesse a contribuir para aumentar ainda mais a confusão e a perturbação do mundo em que vivemos. Infelizmente, é a isso que, às vezes, chamamos "trabalho". Nessas condições, o trabalho é uma espécie de dependêmcia, uma droga... E se não dermos satisfação às exigências desse "Génio trabalhador", adoecemos, morremos... É essa a razão por que muitos reformados adoecem e morrem mais cedo depois de deixarem de trabalhar. O "Génio trabalhador" continua a exigir-lhes mais trabalho. E eles já não têm mais trabalho para lhe dar. Então, têm de fazer qualquer coisa para "matar o tempo", quando o tempo deveria servir para se "viver" plenamente, criativamente. Mas, isso não é possível. Eles nunca aprenderam a fazer mais nada a não ser "trabalhar"! Por isso, o "rabo do porco" continua torto. O Génio trabalhador ainda o não conseguiu endireitar, nem o conseguirá tão depressa . Infelizmente, tudo parece andar cada vez mais torto.
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JOSÉ FLÓRIDOREFLEXÕES Histórico
Março 2017
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